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Mulliner: divisão de personalização da Bentley, perita na arte do impossível

By on 26 Março, 2018

Há, na Bentley, um departamento que se delicia a fazer impossíveis. E não é retórica: é mesmo o seu quotidiano. A divisão de personalização Mulliner desafia a imaginação dos clientes mais exclusivos e requintados, numa atmosfera que junta criatividade e sentido de bom gosto.

– Um compartimento refrigerado em vidro esculpido?

– Sim, é possível…

– Um emblema a ouro e prata no topo do capot?

– Mas é claro, também fazemos…

– E um conjunto de acessórios para falcoaria?

– Pois com certeza que sim. É uma excelente ideia.

– Ah, e já agora: pintar a carroçaria num “preto beluga”?

– Sem problema…

– Bom, mas então mais um metro de carro para caberem umas poltronas tipo avião “vis-a-vis” para um “tete-a-tete” durante a viagem, uma mesa de piquenique, um frigobar com flutes de cristal…

– Pedido aceite também.

– E não esquecer: três mostradores, feitos à mão, um para a hora local, outro para a hora TMG e um terceiro para a temperatura exterior. Possível?

– Consider it done, sir!

– E um “request” de última hora: que tal um acabamento exterior que combine um “Silver Frost” com um “Moroccan Blue”?

– Certíssimo. Anything else?

Na divisão Mulliner, da Bentley, nem o mais excêntrico ou sofisticado dos clientes fica sem resposta, venha ele da Europa, da China ou de um deserto de petróleo do Médio Oriente. Desde a década 50 que é assim, ou se quisermos ser mais rigorosos na História, há mais de 500 anos. A linhagem de carroçadores Mulliner, hoje parte integrante da marca britânica do Grupo Volkswagen, começou com os inovadores trabalhos em carruagens no longínquo 1559, apenas um ano depois de Sua Majestade Isabel I subir ao trono, e passou pela autoria do carro de Estado da Rainha Isabel II. Pelo meio, inúmeras criações de luxo por medida para clientes únicos e a incarnação mais perfeita, e antiga, da personalização de topo. Comparar a Mulliner com qualquer outra divisão de personalização é como colocar lado a lado um alfaiate de Saville Row e uma cadeia de pronto-a-vestir. O mundo automóvel está cheio de histórias com pedigree, mas nenhuma se compara a esta.

Uma família que sempre soube o que queria

Para os mais perfecionistas da História, teríamos de recuar até 1559, ano em que se encontram os primeiros registos de uma certa família Mulliner, que se dedicava à preparação de carruagens e selaria. O passo seguinte de que há menção é, também, muito recuado no tempo: 1760, quando Francis Mulliner foi encarregue da construção e manutenção das carruagens do Royal Mail, os correios britânicos. E isto diz-nos desde logo duas coisas: a primeira, que a família nunca desistiu do seu mister e, a segunda, que o reconhecimento da sua qualidade tem um passado de séculos.

Em 1870, o filho de Francis, Robert Bouverie Mulliner, começou a sua própria empresa de construção de carruagens, denominada Mulliner London Limited, dando um novo impulso ao negócio iniciado pelo pai. O começo do grande salto começaria bem no final do século XIX, quando o seu filho H J Mulliner adquire o negócio da família: decide colocar de lado as carruagens puxadas por cavalos para se dedicar às carroçarias de automóveis e muda a empresa para o elegante bairro londrino de Mayfair, com o nome H.J.Mulliner & Co. Ali, bem no meio da elite britânica, recebia os carros apenas com o chassis e o motor e construía cada carroçaria à medida e de acordo com os pedidos do cliente. Um dos primeiros foi um tal de C. S. Rolls, fundador de uma certa marca chamada Rolls-Royce…

Os anos 20 trouxeram a euforia do automóvel – ou a primeira delas, pelo menos – e Mulliner não ficou indiferente. No salão automóvel de 1923, que então se realizava no centro de exposições Olympia, no não menos elegante bairro de Kensington, Mulliner apresenta uma das suas mais icónicas produções: um modelo de dois lugares sobre um chassis Bentley com motor de 3 litros. Esta seria a primeira ligação entre Mulliner e a marca britânica, numa relação simbiótica que perdura, como se sabe, até aos dias de hoje.

Esta ligação foi-se fortalecendo ao longo dos anos e é nos anos 50 que começa a tornar-se cada vez mais estreita. Em 1952, Mulliner assina um dos mais representativos Bentley de sempre, o R-Type Continental, modelo que inspirou o design do atual Continental GT. Cinco anos depois, outro ícone: o Flying Spur, obra-prima de Mulliner sobre um chassis de um Bentley Continental.

Na sequência deste turbilhão criativo, não é de admirar o próximo passo: em 1959, a Mulliner passa a integrar oficialmente a Bentley, mudando-se para Crewe.

O cliente tem sempre razão

Muito por conta deste passado pleno de experiência, a Mulliner tem o seu lugar único na oferta de personalização do automóvel. Mais do que um simples criador de luxo, esta divisão da Bentley assume o seu papel enquanto carroçador exclusivo, capaz de fazer acompanhar o requinte com soluções tecnologicamente avançadas.

O espírito, esse, mantém-se inalterado: a equipa de artesãos altamente qualificados e experientes da Mulliner – hoje suportados pela vasta experiência de design e tecnológica da Bentley – consegue transformar a visão do cliente em realidade. Quer se trate de um enriquecimento de luxo num modelo de série, quer seja a construção de uma carroçaria especial sob medida. É esse o grande lado diferenciador da Mulliner e da Bentley.

“As possibilidades com a Mulliner são, na sua essência, infinitas – não há nada que os nossos carroçadores não consigam alcançar”, sublinha Steffan Sielaff, o diretor de design da Bentley que, desde Agosto do ano passado, assumiu também a chefia da Mulliner.

Exemplos recentes da arte da Mulliner incluem o Mulsanne Grand Limousine, um exemplo claro das possibilidades que são criadas em Crewe: concebida para um cliente específico, esta limousine demonstra como a Mulliner é mais do que um departamento de personalização decorativa. Os engenheiros criaram um projeto único a partir de um Mulsanne, concebendo uma carroçaria que é 1 metro mais longa e cerca de 80 cm mais alta, tudo para poder acomodar pedidos como quatro poltronas posteriores, frente a frente, para além de elementos tão inéditos como um vidro separador entre o compartimento dos passageiros e os lugares da frente cuja principal característica é a sua tecnologia electrocromática: pode ser escurecido para mais privacidade apenas com o toque de um botão. É inimaginável (ou, pelo menos, a Bentley não revela…) a quantidade de horas de trabalho e de projeto num carro desta natureza: um gigante capaz de atingir os 295 km/h, e de acelerar de 0 a 100 km/ em apenas 5,1 segundos, graças a um V8 de 505 cv.

Mais recentemente, ficaram também célebres as variações sobre o SUV Bentayga, nomeadamente o Falconry, que surge dotado de equipamentos na traseira que os adeptos da falcoaria (e no Médio Oriente existem uns quantos…) consideram indispensáveis para uma expedição bem sucedida.

A Mulliner vive hoje uma das fases mais criativas da sua história recente, fruto das possibilidades tecnológicas e industriais oferecidas pelo Grupo Volkswagen, no qual se insere a Bentley. E poderá ir mais longe, revivendo a arte da construção de carroçarias exemplares únicos. Os responsáveis da marca nunca negaram essa possibilidade e a limousine Mulsanne é um exemplo desse caminho.

A única exceção? “Se um cliente quiser um Bentley que se pareça com um tanque, então dizemos que não!”, como comentava recentemente um alto responsável da marca. Porque só há uma coisa que tem limites: uma reputação a defender.

E, no caso da Mulliner, ela tem 500 anos.

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