Carlos Tavares (PSA Group): um português com toque de Midas
Verdadeiramente impressionante aquilo que Carlos Tavares fez desde que tomou conta do PSA Group, instaurou os programas “Back in the Race” e “Push to Pass” e tirou das mãos da GM o grupo Opel. À beira do abismo, o PSA Group e o Opel Group, são hoje, juntos, o segundo maior construtor europeu.
Não existem adjetivos para o trabalho que Carlos Tavares, ex-COO da Aliança Renault Nissan, fez até ao momento no PSA Group. Anunciado há pouco tempo, o crescimento do lucro face a 2017 ultrapassa os 40% e a margem de lucro operacional é já inveja de todos os construtores europeus. De tal forma que o PSA Group já ultrapassou o Grupo Volkswagen, em setembro, como o maior grupo europeu.
Se puxarmos o filme atrás, até 2012, encontramos o Grupo PSA à beira do abismo depois de anos e anos de prejuízos. Em 2012, o valor final do prejuízo era de 5 mil milhões de euros e tudo foi colocado em causa, nomeadamente, a forma como os responsáveis pelo grupo e a família Peugeot, dona do grupo PSA, se mostravam incapazes de devolver lucro e mais valia aos acionistas. Tudo porque ninguém queria ver a falência do mercado europeu que desde 2008 estava em profunda crise. Ora, centrado no mercado europeu, o negócio do grupo PSA estava em crise e com incapacidade de reduzir custos e perdendo cada vez mais margem operacional, o grupo francês estava estrangulado com um “cash flow” cada vez menor e à beira do abismo.
Com uma previsão de queda, com estrondo, de um dos mais importantes grupos industriais franceses, a família Peugeot aceitou, finalmente, deixar o controlo da companhia. Apelou ao Estado francês e encetou negociações com os chineses da Dongfeng Motor. Ambos acabaram por injetar o dinheiro necessário para financiar a tesouraria do grupo PSA ao comprarem 28% do capital social (14% para cada entidade), obrigaram ao fecho da unidade de produção de Aulnay e ao corte de 8 mil postos de trabalho. O desespero era de tal ordem que a família Peugeot, depois de libertar o controlo do grupo, ainda encetou negociações para que a General Motors comprasse e tomasse conta do grupo francês, através da Opel, marca que perdia dinheiro há anos. O cenário era, verdadeiramente, negro!
O primeiro passo na direção certa foi o financiamento do Estado francês, mas, sobretudo, a ligação à Dongfeng Motor, pois o grupo PSA abriu-se ao oriente e começou a receber os proveitos de vender de forma significativa na China e em outros mercados asiáticos. O segundo passo foi a contratação de Carlos Tavares, livre depois de Carlos Ghosn ter travado a trajetória rumo ao cargo de CEO da Aliança Renault Nissan. Provavelmente, os responsáveis da aliança, se soubessem o que sabem hoje, teriam obrigado Ghosn a sair e tinham retido Tavares. Mas adivinhação é algo que não serve a todos…
Chegado ao grupo PSA, mudou-lhe o nome para PSA Group e instalou, imediatamente, uma nova estratégia denominada “Back in the Race”. Esta nova estratégia desenhava o caminho para a recuperação do PSA Group: reduzir a oferta de modelos dentro da gama de todas as marcas, expansão para fora da Europa e implementação de fortes medidas de redução de custos e maior eficiência de todas as áreas do grupo.
Algumas destas medidas não foram simpáticas e muitos dos “velhos do Restelo” que ainda ocupavam lugares chave dentro do PSA Group, tentaram remar contra a maré de sucesso que se formava, tendo ficado célebre a polémica sobre o vencimento do executivo português, algo que chegou até ao executivo francês.
Indiferente a tudo isso, Carlos Tavares focou-se no trabalho de resgatar o PSA Group e mal implementou a estratégia “Back in the Race” anunciou que iria medir o sucesso das suas ideias através dos valoeres de “cash flow” e de margem operacional libertada. Alguns troçaram, outros encolheram os ombros e ainda outros simplesmente acharam que o português se iria espalhar ao comprido.
Com um prazo de implementação de quatro anos (2014-2018), a estratégia “Back in the race” foi um estrondoso sucesso: no final do primeiro ano de implementação, o PSA Group exibia uma margem operacional de 5% (o objetivo eram 2%) e um luco superior a mil milhões de euros. O primeiro lucro registado pela PSA desde 2010!!! Mas a estratégia fez mais: a produtividade das fábricas do grupo andava nos 65% desde 2010, no final de 2016, estava nos 90%. O “cash flow” subiu de forma incrível e os prejuízos transformaram-se em lucro. Contas feitas, no final de 2016, dois anos antes do prazo dado pela estratégia “Back in the Race”, todos os objetivos foram alcançados!
Estava na hora de entrar em ação a segunda fase da recuperação com o plano “Push to Pass”. O novo plano tinha o foco no lucro, começando de uma base de 5% de margem de lucro operacional (a inveja de todos os construtores europeus), e aprofundar, ainda mais, a redução de custos. Além disso, o “Push to Pass” incluiu o investimento massivo na marca DS (que lançou o primeiro carro não Citroen com o DS7 Crossback) para a diferenciar da Citroen e torna-la como a marca Premium do grupo, a revitalização com produtos á sua imagem da Citroen e fazer regressar a Peugeot às suas raízes. Apostar forte nos segmentos mais valiosos como os SUV e, mais recentemente, prioridade à eletrificação da gama – mesmo que Carlos Tavares seja um cético sobre este assunto – onde o PSA Group está atrasado.
Mas para que o “Push to Pass” fosse um sucesso, Carlos Tavares precisava de produto que fosse bem acolhido pelos consumidores e mais músculo. Como excelente gestor que é, o português tinha tudo pensado: aprovou o lançamento dos Peugeot 3008 e 5008, imediatos sucessos de vendas, mesmo que com preços acima dos rivais, o Citroen C3 que fez regressar muitos clientes da marca e a DS lançou o primeiro carro não Citroen, o DS7 Crossback. Não estranhou que no final de 2017, o PSA Group tenha anunciado volumes de vendas, lucros e margem operacional recordistas: 3,63 milhões de veículos vendidos, 1,56 mil milhões de euros de “cash flow”, 3,991 mil milhões de euros de lucro e 7,1% de margem operacional.
A cereja no topo do bolo foi a compra do grupo Opel à General Motors. Recordamos que apenas quatro anos antes, o grupo PSA estendia a mão à GM para que esta entrasse no capital do grupo. Carlos Tavares viu a oportunidade para ganhar músculo e resgatou a Opel e a divisão britânica Vauxhall. Uma inversão dos papéis que acabou com Tavares a implementar o programa “PACE!” para a recuperação da Opel.
E depois de anos a perder dinheiro, a Opel, no primeiro ano dentro do PSA Group, regressou aos lucros e contribuiu para o excelente resultado do grupo francês. Tudo nas barbas dos mais incrédulos que afirmaram ser a compra da Opel um erro dramático.
Pois bem, o plano “PACE!” reduziu de forma dramática os custos, agilizou procedimentos e no final dos primeiros seis meses de 2018, o lucro operacional é de 502 milhões de euros e suas vendas e excelente performance comercial, permitiu que o lucro do PSA Group tenha subido 40% e permitido, em setembro, o PSA Group seja o segundo maior grupo europeu atrás do grupo VW.
O toque de Midas de Carlos Tavares tem deixado os observadores boquiabertos, mas o caminho não será sempre uma auto estrada: o PSA Group está a perder terreno no mercado chinês – que cada vez mais se mostra uma caixinha de surpresas com grande volatilidade – está atrasado no que toca á eletrificação e necessita de encontrar respostas para alguns modelos chave em termos de vendas e completar gamas para incrementar o lucro. Será Carlos Tavares capaz de manter o ritmo do “Push to Pass!”? Sentado em lucros e margens operacionais fantásticas, Carlos Tavares só terá de usar o seu “toque de Midas” para que o PSA Group seja cada vez mais um “case study” da indústria automóvel mundial.
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