Primeiro ensaio Mercedes EQC 400 4 Matic: primeiro Mercedes elétrico é excelente
Após duas mãos cheias de quilómetros no meio do tráfego de Oslo, onde quem não tem um elétrico é olhado de soslaio, o melhor elogio que posso fazer ao EQC 400 4 Matic é que várias vezes me esqueci que este é um carro elétrico.
Encontrei a capital norueguesa muito diferente desde a minha última passagem por Oslo, tendo enfrentado estradas e uma cidade que nos oferece um vislumbre do futuro. Literalmente, tive a oportunidade de experimentar os engarrafamentos do futuro rodeado, perdão, inundado! por vários modelos da Tesla, pelos mais recentes Audi e-tron e Jaguar i-Pace e pelos mais comuns Nissan Leaf, Renault Zoe e até VW e-Golf.
Pensei com os meus botões “quem não andar com um carro elétrico ou no mínimo híbrido, deverá ser cuspido, certamente!” Investiguei um pouco e fiquei a saber que pelo menos um em cada cinco automóveis privados que circula na capital norueguesa e nos seus arredores, é um automóvel elétrico! Ou seja, quatro horas de viagem levaram-me ao futuro e por isso não podia haver melhor palco para a apresentação deste EQC 400 4 Matic do que a Noruega.
O primogénito da gama EQ
O EQC é o primeiro esforço sério da Mercedes no desconhecido mundo da mobilidade elétrica, descontando o antigo Classe B que tinha aplicado uma bateria da Tesla, aproveitando a proximidade entre a Daimler e a empresa de Elon Msuk.
Sem surpresa, o EQC 400 4Matic é um concorrente direto do Audi e-tron e do Jaguar i-Pace. E, claro, do Tesla Model X, mas a Mercedes não fala nisso. Prefere, em sussurro, dizer que tem como ambição ficar com os clientes descontentes com a Tesla. E, também, com aqueles que preferem pagar o mesmo dinheiro de um Tesla, mas usufruir da qualidade de construção, refinamento e engenharia de topo que, habitualmente, significa a estrela de três pontas e, claro, a imagem de marca da Mercedes.
Surpreendentemente pouco inovador
Sendo um construtor que anda por aqui há mais de uma centena de anos e ofereceu à indústria centenas de inovações, o EQC é, surpreendentemente, normal. Ao contrário dos rivais, não está em cima de uma plataforma desenvolvida, especificamente, para a mobilidade elétrica. Utiliza a mesma plataforma MRA que é usada pelo Classe C e pelo GLC. Mas não se iludam, pois como explicou um os responsáveis do projeto, apenas 15 por cento das peças são comuns. Surpreendido? Não fique!
É uma jogada de maestria por parte da Mercedes. Primeiro porque o EQC pode ser fabricado na mesma linha de montagem do GLC e do Classe C. Depois, porque desconhecendo, nesta altura, qual o sucesso do EQC e qual o volume de encomendas que vai receber, pode flexibilizar a cadência de produção com flutuação, de aumentou ou redução de produção, de 25% sem exigir nenhum investimento extra na fábrica ou em maquinaria. Portanto, esta abordagem mais pragmática deixa claro que a Mercedes (ainda) não trem crença total neste avanço dos veículos elétricos, continua, como todos nós, às “escuras”, mas assim minimiza os riscos financeiros.
O reverso da medalha desta poupança está na engenharia conservadora do EQC face ao que a Tesla e outros construtores já fazem e não consegue aproveitar, totalmente, as vantagens das motorizações elétricas, por exemplo, na habitabilidade. Há uma enorme diferença entre a plataforma achatada de um Tesla – espécie de “skate” em alumínio onde tudo está colocado em baixo e as rodas estão nos cantos da carroçaria – e a base convencional do EQC400 que coloca outros desafios.
Para lá desse constrangimento, o EQC 400 4Matic tem outra dificuldade: apesar de ter quatro rodas motrizes e ter aspeto de SUV desportivo, graças à estreia superfície vidrada e à linha descendente do tejadilho que culmina num portão traseiro, não vai poder ir mais longe que o acesso a casa ou à quinta, subir uns passeios e pouco mais. Porquê? Porque o EQC não tem altura ao solo suficiente e a suspensão não tem regulação em altura.
Como disse, o EQC400 4Matic tem tração integral graças ao contributo do motor elétrico traseiro, já que o outro está montado, anormalmente elevado, na frente. A programação é diferente para os dois motores: o dianteiro está afinado para oferecer um desempenho ótimo nas baixas e médias acelerações, enquanto o traseiro está desenhado para oferecer toda a potência disponível. O que é que isto significa?
Bom, rodando com aceleração leve e sendo conduzido de forma eficiente, o EQC 400 utiliza, apenas, o motor dianteiro, desligando o traseiro, funcionando como um tração dianteira. Mas a todo o momento o sistema monitoriza a situação, fazendo o motor traseiro entrar em ação caso seja necessário mais desempenho.
O EQC 400 tem cinco modos de condução que influenciam motores, direção e o controlo de estabilidade. Disponibiliza, também, cinco modos de regeneração. Vamos aos primeiros.
O modo por defeito é o Comfort, com o pedal do acelerador a ser suave, mas pronto para quando há a necessidade de puxar pelos motores elétricos. Se optar pelo modo Eco, o EQC 400 foca-se na máxima poupança de energia e maior eficácia de utilização. Necessitando da maior autonomia possível, tem de escolher o modo “Max Range” e beneficiar da ajuda do software do carro para maximizar a autonomia. Caso pretenda ser ousado, o modo Sport também está disponível e o sistema foca-se não na eficiência, mas na performance. Finalmente, se tiver coragem ou desejar configurar a condução do EQC 400, pode optar pelo modo Individual e personalizar diversos parâmetros.
Quanto à regeneração, podem controlar os níveis de recuperação de energia da travagem e da desaceleração através das patilhas colocadas atrás do volante, iguais às de uma caixa automática comum. Temos então os modos D+ (o carro segue solto sem regeneração, mas sem necessitar de muita energia para avançar), D (baixa regeneração), D- (regeneração média) e D – – (elevada regeneração). Este modo permite a condução apenas com um pedal. Como?
Como a regeneração é muito intensa, o pedal de travão torna-se, quase, dispensável pois a desaceleração é muito forte e a velocidades citadinas, a imobilização consegue-se facilmente.
Finalmente, o modo D Auto, gerido pelo Eco Assist, um sistema inteligente que ajuda os condutores a alcançar a máxima eficiência, através da capacidade de antever o que vai acontecer à frente. Fá-lo com a ajuda do sistema de navegação, reconhecimento dos sinais de trânsito e informação dos sistemas de segurança (radares e câmaras), tudo a funcionar em conjunto. Desta forma, o sistema ajuda-o a acelerar quando é preciso e a desacelerar quando está próximo do limite de velocidade, adaptando as funções de velejar (andar sem regeneração com mínimo gasto de energia) e de regeneração de energia.
O modo Max Range que acima referi, foi desenvolvido para o EQC e encoraja o condutor a respeitar os limites de velocidade através de um ressalto no curso do acelerador, maximizando assim o consumo de energia e aumentando a autonomia. O sistema funciona em conjunto com o sistema de navegação otimizado do EQC, escolhendo a rota com o perfil mais favorável à poupança de energia, respeitando os limites de velocidade e a distância para os outros veículos, maximizando a utilização da regeneração para evitar o uso da travagem e alargar a autonomia.
Um Mercedes que é um… Mercedes
O EQC 400 4Matic é um carro do século XXI, mas em utilização é um… Mercedes. Tudo no carro é igual a um dos modernos veículos da casa de Unterturkheim, os bancos são iguais, as regulações estão todas no mesmo sítio, o comando da caixa e dos limpa para brisas também, portanto, o EQC não é nenhum estranho.
Colocado em andamento sem mexer em nada daquilo que acima expliquei e começando com o modo utilizado por defeito, Comfort, é fácil sair dos blocos com uma dose pequena de aceleração. Sem mexer na regeneração de energia, o EQC 400 até parece leve tal a forma como avança sem hesitações.
Convirá lembrar que este é um carro muito pesado com quase 2,5 toneladas e que entre os dois eixos tem 652 quilos de baterias, com uma distância entre eixos igual à do GLC 2873, mas sendo mais comprido (4761 mm), mais estreito (1884 mm) e mais baixo que o GLC (1673 mm). Por isso não estranha que o carro pareça maior do que na realidade é, embora controle muito bem os movimentos da carroçaria. A curvar, o peso sente-se, pelo que entrar em curva com algum excesso de confiança, ou sair igualmente com entusiasmo, verá o EQC perder aderência no eixo dianteiro e alargar a trajetória. Ou seja, o EQC 400 4Matic controla bem os movimentos da carroçaria, mas é pesado, a direção é dormente e tudo isto não foi feito para andar depressa. Anda, mas com naturais limitações. E, já agora, opte sempre pelos pneus Michelin Pilot Sport e não pelos Pirelli Scorpion Verde, pois têm muito mais aderência e as jantes de 21 polegadas ficam a matar no EQC. O que perde em mais ruído e algum desconforto quando a estrada é menos regular, compensa.
Em autoestrada, o EQC 400 é imperial, com enorme serenidade, refinamento e, não fossem os pneus, seria um ambiente de silêncio absoluto. No interior não escutamos os ruídos habituais num carro elétrico. Mas os técnicos da Mercedes não conseguiram evitar que em redor dos espelhos o vento comece a fazer algum ruído a partir dos 120 km/h, nada de incomodativo, tenho de o dizer.
Autonomia depende das condições atmosféricas
Chegando dos 0-100 km/h em 4,8 segundos (excelente para um carro de 2,5 toneladas), o EQC 400 4Matic tem a velocidade limtada aos 180 km/h, questão de proteger a autonomia que, oficialmente, oscila entre os 445 e os 471 km, homologadas no ciclo NEDC. Mas um dos responsáveis pelo desenvolvimento do projeto confessou-me que no Inverno e em temperaturas abaixo de zero, a autonomia da bateria de 80 kWh, deverá ficar entre os 260 e os 270 quilómetros. Mostrei surpresa e ele foi claro ao lembrar que a física tem as suas leis e limitações e esta é uma delas, pelo que nem a Mercedes nem ninguém conseguirá fazer diferente. Pois é…
Interior… Mercedes!
Se me vendassem os olhos, depositassem dentro do EQC e depois de fechadas as portas, removesse a venda, diria que estava dentro de um GLC ou de outro Mercedes qualquer. Olhando melhor, iria perguntar se tinha havido alguma novidades nos ventiladores do sistema de climatização, cujo estilo é totalmente diferente e com detalhes pintados em bronze. Mas não há mais diferenças! O volante é igual os comandos são os mesmos, o sistema MBUX é de série e continua a ser muito divertido e fácil de usar e o painel de instrumentos com dois ecrãs de generosas dimensões, está arrumado da mesma maneira que no GLC ou em outro dos novos Mercedes.
Como referi acima, a habitabilidade não aproveita o facto do carro ser elétrico, pois a utilização de uma plataforma não dedicada à mobilidade elétrica, oferece alguns compromissos. Seja como for, o espaço no habitáculo é generoso para um carro deste tamanho, mas na largura as coisas são um nadinha mais acanhadas. Quem seguir no lugar do meio do banco traseiro, sofrerá com o túnel de transmissão, que não fazendo falta ao EQC é original na plataforma que lhe serve de base. Além disso, o motor está montado muito mais acima do que é habitual num carro elétrico e precisa de uma proteção, o mesmo se passando com o motor traseiro.
Veredicto
Então não é que uma marca nascida no século 19 está pronta para tramar a neófita Tesla no seu ambiente?! Como disse no início, o melhor elogio que posso fazer a este Mercedes EQC 400 4Matic é que me fez esquecer ser este um carro elétrico. Sedutor e carregado de qualidade e tecnologia, consegue estar ao lado de um Mercedes comum sem ser apontado. Fácil de conduzir e simples de utilizar, o EQC 400 4Matic foi uma agradável surpresa. O preço de 78.450 euros não é acessível a todos, mas pesando os prós e os contras, justificam-se e de todos os modelos elétricos que já conduzi, foi o único que me deixou com pena de o entregar.
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